Auto-Retrato - Manoel de Barros.


Auto-Retrato
Ao nascer eu não estava acordado, de forma que
não vi a hora.
Isso faz tempo. 
Foi na beira de um rio. 
Depois eu já morri 14 vezes. 
Só falta a última. 
Escrevi 14 livros. 
E deles estou livrado. 
São todos repetições do primeiro. 
Posso fingir de outro, mas não posso fugir de mim. 
Já plantei dezoito árvores, mas pode que só quatro. 
Em pensamento e palavras namorei noventa moças, 
mas pode que nove. 
Produzi desobjectos, 35, mas pode que onze. 
Cito os mais bolinados: um alicate cremoso, um 
abridor de amanhecer, uma fivela de prender silêncios, 
um prego que farfalha, um parafuso de veludo, etc. etc. 
Tenho uma confissão: noventa por cento do que 
escrevo é invenção; só dez por cento que é mentira. 
Quero morrer no barranco de um rio: sem moscas 
na boca descampada. 

Manoel de Barros.

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