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Mostrando postagens de fevereiro, 2016

Amar - Carlos Drummond de Andrade.

Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar? amar e esquecer, amar e malamar, amar, desamar, amar?  sempre, e até de olhos vidrados, amar?  Que pode, pergunto, o ser amoroso,  sozinho, em rotação universal,  senão rodar também, e amar?  amar o que o mar traz à praia,  o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,  é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?  Amar solenemente as palmas do deserto,  o que é entrega ou adoração expectante,  e amar o inóspito, o cru,  um vaso sem flor, um chão de ferro,  e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e  uma ave de rapina.  Este o nosso destino: amor sem conta,  distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,  doação ilimitada a uma completa ingratidão,  e na concha vazia do amor a procura medrosa,  paciente, de mais e mais amor.  Amar a nossa falta mesma de amor,  e na secura nossa amar a água implícita,  e o beijo tácito, e a sede infinita.  Carlos Drummond de Andrade.

Foi-se a Copa? - Carlos Drummond de Andrade.

Foi-se a Copa? Não faz mal. Adeus chutes e sistemas. A gente pode, afinal, cuidar de nossos problemas. Faltou inflação de pontos? Perdura a inflação de fato. Deixaremos de ser tontos se chutarmos no alvo exato. O povo, noutro torneio, havendo tenacidade, ganhará, rijo, e de cheio, A Copa da Liberdade. Carlos Drummond de Andrade.

Perguntas - Carlos Drummond Andrade.

“Perguntei-lhe por fim a razão sem razão de me inclinar aflito sobre restos de restos, de onde nenhum alento vem refrescar a febre desse repensamento: sobre esse chão de ruínas imóveis, militares na sua rigidez que o orvalho matutino já não banha ou conforta. No vôo que desfere, silente e melancólico, rumo da eternidade ele apenas responde (se acaso é responder a mistérios, somar-lhes um mistério mais alto): Amar depois de perder.” Carlos Drummond Andrade.

Consolo na praia - Carlos Drummond de Andrade.

Vamos, não chores… A infância está perdida. A mocidade está perdida. Mas a vida não se perdeu. O primeiro amor passou. O segundo amor passou. O terceiro amor passou. Mas o coração continua. Perdeste o melhor amigo. Não tentaste qualquer viagem. Não possuis casa, navio, terra. Mas tens um cão. Algumas palavras duras, em voz mansa, te golpearam. Nunca, nunca cicatrizam. Mas, e o humour? A injustiça não se resolve. À sombra do mundo errado murmuraste um protesto tímido. Mas virão outros. Tudo somado, devias precipitar-se – de vez – nas águas. Estás nu na areia, no vento… Dorme, meu filho. Carlos Drummond de Andrade.

Ausência - Carlos Drummond de Andrade.

Ausência Por muito tempo achei que a ausência é falta. E lastimava, ignorante, a falta. Hoje não a lastimo. Não há falta na ausência. A ausência é um estar em mim. E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços, que rio e danço e invento exclamações alegres, porque a ausência, essa ausência assimilada, ninguém a rouba mais de mim. Carlos Drummond de Andrade.

O amor que move o sol e as estrelas. Amar se aprende amando - Carlos Drummond de Andrade.

Dante escreveu que Deus não é apenas uma imagem ofuscante de luz gloriosa, mas que ele é acima de tudo, l'amor che move il sole e l'altre stelle...'O amor que move o Sol e as outras estrelas'. " “O amor que move o sol, como as estrelas.” “O verso de Dante é uma verdade resplandecente, e curvo-me ante a sua magnitude. Ouso insinuar, sem pretensão a contribuir para se que desvende o mistério amoroso: Amar se aprende amando. Sem omitir o real cotidiano, também matéria de poesia."  Carlos Drummond de Andrade.

Que a felicidade não dependa do tempo - Carlos Drumond de Andrare.

Que a felicidade não dependa do tempo, nem da paisagem, nem da sorte, nem do dinheiro. Que ela possa vir com toda a simplicidade, de dentro para fora, de cada um para todos. Carlos Drummond de Andrade.

Quando encontrar alguém - Carlos Drummond de Andrade

“Quando encontrar alguém e esse alguém fizer seu coração parar de funcionar por alguns segundos, preste atenção: pode ser a pessoa mais importante da sua vida. Se os olhares se cruzarem e, neste momento, houver o mesmo brilho intenso entre eles, fique alerta: pode ser a pessoa que você está esperando desde o dia em que nasceu. Se o toque dos lábios for intenso, se o beijo for apaixonante, e os olhos se encherem d’água neste momento, perceba: existe algo mágico entre vocês.  Se o primeiro e o último pensamento do seu dia for essa pessoa, se a vontade de ficar juntos chegar a apertar o coração, agradeça: Deus te mandou um presente: O Amor.  Por isso, preste atenção nos sinais - não deixe que as loucuras do dia-a-dia o deixem cego para a melhor coisa da vida: O AMOR.”  Carlos Drummond de Andrade.

Para Sempre - Carlos Drummond de Andrade.

Para Sempre Por que Deus permite  que as mães vão-se embora?  Mãe não tem limite,  é tempo sem hora,  luz que não apaga  quando sopra o vento  e chuva desaba,  veludo escondido  na pele enrugada,  água pura, ar puro,  puro pensamento.  Morrer acontece  com o que é breve e passa  sem deixar vestígio.  Mãe, na sua graça,  é eternidade.  Por que Deus se lembra  — mistério profundo —  de tirá-la um dia?  Fosse eu Rei do Mundo,  baixava uma lei:  Mãe não morre nunca,  mãe ficará sempre  junto de seu filho  e ele, velho embora,  será pequenino  feito grão de milho.  Carlos Drummond de Andrade.

Diante de uma criança - Carlos Drummond de Andrade.

Diante de uma criança Como fazer feliz meu filho? Não há receitas para tal. Todo o saber, todo o meu brilho  de vaidoso intelectual  vacila ante a interrogação  gravada em mim, impressa no ar.  Bola, bombons, patinação  talvez bastem para encantar?  Imprevistas, fartas mesadas,  louvores, prêmios, complacências,  milhões de coisas desejadas,  concedidas sem reticências?  Liberdade alheia a limites,  perdão de erros, sem julgamento,  e dizer-lhe que estamos quites,  conforme a lei do esquecimento?  Submeter-se à sua vontade  sem ponderar, sem discutir?  Dar-lhe tudo aquilo que há  de entontecer um grão-vizir?  E se depois de tanto mimo  que o atraia, ele se sente  pobre, sem paz e sem arrimo,  alma vazia, amargamente?  Não é feliz. Mas que fazer  para consolo desta criança?  Como em seu íntimo acender  uma fagulha de confiança?  Eis que acode meu coração  e oferece, como uma flor,  a doçura desta lição:  da

O que é duradouro - Carlos Drummond de Andrade.

O que é duradouro não é o que resiste ao tempo, mas o que, sabiamente, muda com ele. Carlos Drummond de Andrade.

As sem-razões do amor - Carlos Drummond de Andrade.

As sem-razões do amor Eu te amo porque te amo, Não precisas ser amante, e nem sempre sabes sê-lo.  Eu te amo porque te amo.  Amor é estado de graça  e com amor não se paga.  Amor é dado de graça,  é semeado no vento,  na cachoeira, no eclipse.  Amor foge a dicionários  e a regulamentos vários.  Eu te amo porque não amo  bastante ou demais a mim.  Porque amor não se troca,  não se conjuga nem se ama.  Porque amor é amor a nada,  feliz e forte em si mesmo.  Amor é primo da morte,  e da morte vencedor,  por mais que o matem (e matam)  a cada instante de amor.  Carlos Drummond de Andrade.